Introdução
Gerir uma sala de aula constituída por um grupo heterogéneo de alunos, quer em termos de aprendizagem, quer em termos de comportamento, constitui um dos desafios mais exigentes com que os professores deparam. Como promover a atenção dos alunos? Que estratégias devo usar para manter os alunos concentrados nos conteúdos que estou a leccionar? Como posso introduzir elementos práticos para evitar a monotonia e estimular o interesse da turma? Estas serão, porventura, algumas das questões que os professores se colocam quando reflectem acerca das estratégias de ensino ou durante a planificação das aulas.
Numa sociedade cada vez mais desenvolvida e de fácil acesso a métodos e estratégias potencialmente estimulantes da aprendizagem, os brinquedos de relaxamento parecem ter vindo a destacar-se nos últimos anos. De acordo com Kriescher e Hulac (2023), os brinquedos de relaxamento (do inglês fidget toys) são, cada vez mais, propagandeados não só como uma ferramenta de apoio à aprendizagem para o aumento da concentração dos alunos, mas também como uma ferramenta que os professores podem facilmente implementar na sala de aula para a diminuição de sintomas de ansiedade, de Perturbação de Hiperactividade e Défice de Atenção, ou da Perturbação do Espectro do Autismo. Face ao anunciado, torna-se imperativo determinar se estas alegações são apoiadas pela evidência. Kriescher e Hulac (2023) respondem a esta dúvida evidenciando a ausência de sustentação científica robusta.
O que diz a investigação acerca da eficácia dos brinquedos de relaxamento?
As conclusões acerca da eficácia dos brinquedos de relaxamento são inconsistentes. Alguns estudos sugerem que os brinquedos de relaxamento podem promover a atenção e o desempenho cognitivo dos alunos. A título de exemplo, num estudo realizado em 2006 por Stalvev e Brasell, alunos do 6.º ano de escolaridade apresentaram, em comparação com o grupo de controlo, uma melhoria no desempenho da escrita e uma diminuição da distracção quando usaram bolas anti-stress durante o ensino da escrita. No entanto, outros estudos concluíram que a utilização destes brinquedos pode ter um efeito negativo na atenção em sala de aula e, por extensão, na memória e aprendizagem dos alunos. A este propósito, Hulac e colaboradores (2020) verificaram que o desempenho de alunos do 3.º ano numa actividade de Matemática foi significativamente mais baixo quando permitida a utilização de giradores de dedo (no original, fidget spinners). Os investigadores concluíram que brinquedos deste tipo constituem uma fonte de estímulos cinestésicos e visuais potencialmente perturbadora para os alunos que os utilizam.
Segundo Kriescher e Hulac (2023), dada a falta de evidência consistente acerca do uso de brinquedos de relaxamento na sala de aula, a decisão acerca da respectiva aplicação pedagógica pode orientar-se por duas importantes teorias : a Teoria do Processamento Sensorial e a Teoria da Atenção e Carga Cognitiva.
Teoria do Processamento Sensorial (no original, Sensory Processing Theory; Dunn, 2007)
A Teoria do Processamento Sensorial (Dunn, 2007) postula que os alunos necessitam de diferentes níveis de estimulação sensorial para atingirem o máximo de activação. Neste sentido, pouca estimulação resulta em subactivação, deixando os alunos entediados e desinteressados. Por outro lado, uma quantidade excessiva de estimulação produz hiperactivação, deixando os alunos incapazes de prestar atenção e de se comportar adequadamente. Ainda assim, a aplicação destes princípios ao uso de brinquedos de relaxamento em sala de aula carece de demonstração e permanece, por isso, especulativa.
Teoria da Atenção e Carga Cognitiva (no original, Attention and Cognitive Load Theory; Choi et al., 2014)
De acordo com a Teoria da Atenção e Carga Cognitiva (Choi et al., 2014), se as exigências de determinada tarefa e a estimulação sensorial excederem a capacidade de memória de trabalho dos alunos, estes podem não ser capazes de concluir a tarefa. Os brinquedos de relaxamento, além de aumentarem a carga cognitiva dos utilizadores, constituem também uma fonte de distracção para os colegas que os observam.
Conclusão
Até à data, poucos estudos analisaram, de forma explícita, o efeito dos brinquedos de relaxamento na atenção, comportamento e aprendizagem. As alegações acerca do efeito positivo destes brinquedos na sala de aula baseiam-se em investigação que frequentemente carece de rigor metodológico, revisão por pares, definições operacionais e replicação. Segundo Kriescher e Hulac (2023), os professores e restantes profissionais de educação devem, portanto, proceder com muito cuidado ao considerar a adopção e implementação destes brinquedos para favorecer o comportamento ou a atenção na sala de aula.
A literatura sugere, globalmente, que os efeitos negativos dos brinquedos de relaxamento na atenção, e consequentemente na aprendizagem, superam os potenciais benefícios sensoriais. O uso destes brinquedos pode, especificamente, conduzir a uma diminuição do comportamento focado na tarefa e, por conseguinte, do desempenho escolar (teoria da Atenção e Carga Cognitiva). O argumento de que os brinquedos de relaxamento podem fornecer a estimulação sensorial adicional de que alguns alunos precisam (Teoria do Processamento Sensorial) permanece, portanto, especulativo. Além disso, Kriescher e Hulac (2023) destacam um aspecto de importante reflexão: embora seja possível argumentar que o uso de brinquedos de relaxamento, mesmo sem apoio empírico, é melhor do que não fazer nada, a aplicação de intervenções não validadas pela investigação pode ser mais prejudicial do que benéfica.
As questões e recomendações para o uso de brinquedos de relaxamento nas escolas apresentadas abaixo podem ser bastante orientadoras:
1. Por que razão o uso de brinquedos de relaxamento tem sido recomendado cada vez mais?
Não há evidência de que os brinquedos de relaxamento sejam úteis na promoção da atenção ou do comportamento adequado dos alunos. Contudo, para os alunos que gostam particularmente destes brinquedos, eles podem ser utilizados como reforço ou recompensa para comportamentos-alvo.
2. Em que situações os alunos podem usar os brinquedos de relaxamento?
Não há evidência de que os brinquedos de relaxamento sejam eficazes durante instruções em grupo. No entanto, o uso destes brinquedos pode ser apropriado nos intervalos. Porém, é muito importante comparar os benefícios dos brinquedos de relaxamento com os benefícios de outras actividades.
3. Como supervisionar o uso destes brinquedos?
Monitorizar o uso adequado de brinquedos de relaxamento deve estar sob a responsabilidade de um adulto, a não ser que tenham sido ensinadas estratégias de auto-regulação aos alunos. Sem monitorização, é muito provável que o uso destes brinquedos evolua de apropriado a contraproducente e, por fim, prejudicial.
4. Como monitorizar a eficácia do uso dos brinquedos de relaxamento?
Tomar decisões fundamentadas acerca do uso de brinquedos de relaxamento na sala de aula requer, por exemplo, avaliar de que forma estes brinquedos afectam comportamentos de interesse, tais como o comportamento focado na tarefa, falar durante a aula e o comportamento de socialização.
Referências bibliográficas
Choi H., van Merrienboer Jeroen J. G., Paas F. (2014). Effects of the physical environment on cognitive load and learning: Towards a new model of cognitive load. Educational Psychology Review, 26(2), 225–244.
Dunn W. (2007). Supporting children to participate successfully in everyday life by using sensory processing knowledge. Infants & Young Children: An Interdisciplinary Journal of Early Childhood Intervention, 20(2), 84–101.
Hulac D. M., Aspiranti K., Kriescher S., Briesch A. M., Athanasiou M. (2020). A multisite study of the effect of fidget spinners on academic performance. Contemporary School Psychology, 25, 582–588. https://doi.org/10.1007/s40688-020-00292-y
Kriescher, S. L., Hulac, D. M., Ryan, A. M., & King, B. L. (2023). Evaluating the evidence for fidget toys in the classroom. Intervention in School and Clinic, 59(1), 66-69. https://doi.org/10.1177/10534512221130070
Stalvey, S., & Brasell, H. (2006). Using Stress Balls to Focus the Attention of Sixth-Grade Learners. Journal of At-Risk Issues, 12(2), 7-16.
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