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Várias estratégias podem ser usadas para aproveitar ao máximo as possibilidades que a educação online nos dá e evitar os riscos que nos pode trazer. Richard Clark (2001) defendeu enfaticamente que o que gera aprendizagem são os métodos de instrução (as estratégias) e não os meios (online ou presencial). Se se utilizarem as melhores estratégias, poderemos evitar declínios na aprendizagem.

«Não é o meio que determina se o ensino é efectivo ou eficiente, mas antes o método», Paul A. Kirshner & Carl Henrick, How Learning Happens, Routledge 2020

Por necessidade ou por escolha, o ensino online é cada vez mais comum. Pode ter alguns benefícios (Gernsbacher, 2015), mas terá necessariamente alguns efeitos negativos (Bettinger et al., 2017). Como maximizar os efeitos positivos e minimizar os negativos? A resposta passa por utilizar, nas tecnologias disponíveis, as estratégias de aprendizagem já identificadas como as que fomentam a aprendizagem em aulas tradicionais. Ou seja, aplicar estratégias que se baseiam em princípios psicológicos e pedagógicos bem estabelecidos. 

Prática da recuperação

Recuperar conhecimentos, ou seja, realizar testes sobre eles e reproduzir esses conhecimentos em contextos vários, aumenta a aprendizagem em sala de aula (McDaniel et al., 2011), mas também nas aulas online (Thomas et al., 2018). Ou seja, preparar questionários e actividades que levem os alunos a recuperar os conteúdos ensinados deverá fomentar a aprendizagem. No entanto, é essencial que os alunos, apesar de estarem em casa e terem acesso a todos os materiais, não caiam na tentação de responder a estes testes com auxílio desses materiais. Como evitá-lo? Os especialistas têm adiantado várias sugestões. Primeiro, ao contrário dos testes de avaliação, que também são necessários, estes testes formativos não devem contar para a nota final. Segundo, para incentivar os alunos, estes podem receber crédito pelo simples facto de completarem a tarefa. Terceiro, estes testes e actividades podem ser “corrigidos” por outros alunos; isto motivará os alunos a completarem as tarefas e proporcionar-lhes-á outra actividade de estudo enquanto corrigem as actividades dos colegas. Quarto, é fundamental dar informação aos alunos — não exactamente sobre o seu desempenho individual, mas sobre as respostas correctas.

Espaçamento e prática intercalada

Além de programar testes online, é importante que estes sejam espaçados no tempo e que foquem temas diferentes de forma intercalada (Brunmair & Richter, 2019). Isto é facilmente feito online, programando a altura em que as diferentes actividades estão disponíveis aos alunos e dando-lhes uma janela de tempo para as completarem. 

Esta estratégia é válida também para a forma como os conteúdos – as aulas –, são preparados e “doseados.” Sabe-se há muito tempo que sessões mais curtas e mais frequentes tendem a aumentar a aprendizagem (Underwood, 1961). Portanto, preparar vídeos expositivos curtos, seguidos de actividades de teste, será melhor do que preparar vídeos expositivos longos. Por exemplo, se uma aula tradicional teria 50 minutos, poderão ser preparados 5 vídeos de 5 minutos cada e 5 actividades curtas e variadas que os alunos são instruídos a praticar de forma intercalada. Sempre que possível, o aluno poderá até completar tarefas de diferentes disciplinas intercaladamente. 

Facilitar a aprendizagem activa e o processamento profundo

Encorajar os alunos a serem activos na sua própria aprendizagem, procurando e interpretando sempre que possível a informação, aumenta a aprendizagem (Prince, 2004). Além disso, fomentar o sentido de autonomia dos alunos pode aumentar a sua motivação (Reeve, 2002), com resultados positivos no desempenho. Preparar actividades que tiram partido da quantidade de informação disponível na internet e da rapidez com que se consegue aceder a diversas fontes de informação pode aumentar a motivação e facilitar a aprendizagem activa, por levar os alunos a fazer escolhas. Esta abundância de informação também pode ser aproveitada para levar os alunos a explorar os tópicos de estudo mais profundamente do que fariam numa aula tradicional. No entanto, há que tomar precauções, porque demasiada informação também pode dificultar este processo de escolha. Assim, torna-se importante que as actividades propostas sejam bem estruturadas de modo a guiar a escolha dos alunos e, sempre que possível, exemplificar como uma boa pesquisa na internet pode ser feita (por exemplo, usar a Wikipédia, que contém informação bastante correcta, em vez de fazer uma pesquisa geral no Google). 

Preparação de vídeos e outros materiais

Como já foi mencionado, preparar vídeos e actividades curtas poderá beneficiar a aprendizagem. Mas é muito importante respeitar alguns princípios gerais quando se preparam materiais multimédia. Richard Mayer (2008) enumera um conjunto de princípios que podem ser úteis para selecionar ou criar actividades online, vídeos expositivos, jogos educacionais, ou mesmo apresentações de PowerPoint: coerência, sinalização, não redundância, contiguidade espacial, contiguidade temporal, segmentação, organização prévia, e modalidade (ver infografia em baixo). A aplicação destes princípios, que são baseados em experiências científicas, contribui para que os alunos possam focar a sua capacidade de processamento nos conteúdos que são de facto essenciais.

Fomentar o sentido de pertença e comunidade

Este é talvez um dos maiores desafios na educação online. Como pode um professor estimular o sentido de comunidade e de trabalho, que são ainda mais importantes para a aprendizagem e o desenvolvimento dos alunos (Reeve, 2002) quando estes estão a trabalhar individualmente, nas suas casas e, possivelmente, a ritmos diferentes? Fazer as aulas online mais interactivas é a primeira resposta para evitar que os aspectos sociais da aprendizagem desapareçam. Isto pode ser feito através de projectos virtuais que requerem trabalho de grupo e introduzindo momentos regulares adicionais, mas curtos, de interação entre professores e estudantes. A discussão entre estudantes não deve ser eliminada, mas antes transferida para grupos de discussão online – o que até pode facilitar mais a participação de alunos do que no formato tradicional de sala de aula. A utilização de canais de informação mais informais, como o Facebook, também pode ser uma solução para alunos e professores. Há também outras plataformas que podem facilitar a comunicação, como o Zoom, uma aplicação gratuita que permite videochamadas com o máximo de 40 minutos e de 100 utilizadores; ou o Flipgrid, uma aplicação também gratuita que facilita curtas discussões em formato de vídeo e é já utilizada por vários professores (ver por exemplo como a professora e investigadora Pooja K. Agarwal utiliza Flipgrid em exercícios de prática de recuperação). Estes são apenas dois exemplos de aplicações gratuitas e fáceis de usar que podem facilitar a participação dos alunos e evitar um declínio drástico no sentido de comunidade quando se transferem aulas do formato tradicional para o formato online.

Referências

Bettinger, E. P., Fox, L., Loeb, S., & Taylor, E. S., «Virtual classrooms: How online college courses affect student success», American Economic Review, 107(9), 2017, pp. 2855-75.

Brunmair, M., & Richter, T., «Similarity matters: A meta-analysis of interleaved learning and its moderators», Psychological Bulletin, 145(11), 2019, 1029.

Clark, R., «Learning from Media: Arguments, Analysis, and Evidence», Greenwich, Connecticut: Information Age Publishing, 2001.

Gernsbacher, M. A., «Why internet-based education?», Frontiers in Psychology, 5, 2015, 1530.

Giles, J., «Internet encyclopaedias go head to head», Nature 438, 2005, pp. 900–901.

McDaniel, M. A., Agarwal, P. K., Huelser, B. J., McDermott, K. B., & Roediger III, H. L., «Test-enhanced learning in a middle school science classroom: The effects of quiz frequency and placement», Journal of Educational Psychology, 103(2), 2011, pp. 399-414.

Mayer, R. E., «Applying the science of learning: Evidence-based principles for the design of multimedia instruction», American Psychologist, 63(8), 2008, 760.

Prince, M., «Does active learning work? A review of the research», Journal of Engineering Education, 93(3), 2004, pp. 223-231.

Reeve, J., «Self-determination theory applied to educational setting», In E. L. Deci & R. M. Ryan (Eds.), Handbook of self-determination research, University of Rochester Press, 2002, pp.183-203.

AUTOR

Ludmila D. Nunes é a diretora de conhecimento científico na American Psychological Association (APA). Doutorada em Psicologia pela Universidade de Lisboa, desenvolveu a sua investigação na área de Memória Humana e Aprendizagem na Washington University in St. Louis, na Universidade de Purdue, e na Universidade de Lisboa. 

Além da investigação, deu aulas de Introdução à Psicologia Cognitiva e de Memória Humana na Universidade de Purdue e foi revisora para várias publicações científicas. Até recentemente, foi escritora científica para a Association for Psychological Science (APS)

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