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Numa investigação publicada na revista Scientific Studies of Reading, um grupo de investigadores da Universidade de Oxford e da Universidade Católica Australiana verificou que a qualidade inicial da caligrafia prediz o desenvolvimento da capacidade de escrita das crianças. No entanto, não verificou o mesmo relativamente à leitura.

Este estudo é interessante, pois existindo alguns modelos teóricos que sugerem a importância da escrita à mão para a aprendizagem da leitura e escrita, são ainda escassos os dados científicos que sustentam esta importância. E os dados que existem referem-se a sistemas não-alfabéticos.

Na ortografia chinesa, por exemplo, tem sido sugerido que a escrita assume um papel crítico na aprendizagem da estrutura visual dos caracteres. Por isso, na ortografia chinesa, as capacidades iniciais de escrever à mão estariam simultaneamente relacionadas com a capacidade de leitura e escrita.

Nos sistemas alfabéticos, porém, os dados sobre a relação entre a capacidade de escrever à mão e a capacidade de leitura e escrita são bastante limitados.

A investigação de aqui se dá notícia, é, segundo os seus autores, o primeiro estudo longitudinal com uma amostra ampla e representativa que procura esclarecer essa relação. Mais especificamente, os investigadores procuraram responder à seguinte pergunta: a qualidade inicial da caligrafia prediz o desenvolvimento da leitura e escrita? Ou seja, será que a qualidade de caligrafia adquirida numa determinada etapa de aprendizagem é um factor estatisticamente explicativo da capacidade de leitura e escrita alcançada numa etapa posterior?

Para tentar responder a esta questão, os investigadores seleccionaram 569 crianças de 11 escolas primárias de Brisbane, na Austrália. Os alunos foram avaliados de seis em seis meses, em três momentos: no final do 1º ano de escolaridade (média de idades: 69,65 meses), no início do 2º ano (média de idades: 75,69 meses) e no fim desse mesmo ano (média de idades: 81,23 meses).

No primeiro momento, as crianças foram avaliadas em diversas capacidades básicas de alfabetização: conhecimento das correspondências letras- sons, consciência fonémica, nomeação rápida, e leitura e escrita de palavras simples.

No segundo momento, foram avaliadas em coordenação motora fina e qualidade da caligrafia, nomeadamente formato das letras, inclinação, ritmo, habilidade e aparência geral. No terceiro momento, foram avaliadas em capacidade de leitura e escrita.

 

Os resultados mostraram que:

  1. A qualidade inicial da caligrafia está moderadamente correlacionada com a capacidade de leitura e escrita;
  2. A qualidade inicial da caligrafia prediz o desenvolvimento posterior da escrita, mas não de leitura.

Como os autores do estudo referem, os resultados são consistentes com a perspectiva de que as capacidades de transcrição estão íntima e reciprocamente relacionadas com a alfabetização.

O facto de a qualidade inicial da caligrafia estar positivamente relacionada com o desenvolvimento da competência de escrita está também de acordo com as teorias que defendem que a escrita de palavras pode promover a formação de representações ortográficas de palavras escritas na memória motora.

Pais e educadores podem, nesse sentido, incentivar as crianças a treinar sistematicamente a caligrafia, bem como a praticar regularmente a escrita de palavras, de forma a estimular o desenvolvimento dessas representações.

A escrita de palavras, concluem os autores do estudo, é muito importante para fixar a ordem das letras nas palavras. Não se deve, porém, concluir que tal treino tenha necessariamente reflexos na capacidade de leitura.


Referência Bibliográfica: Pritchard, V. E., Malone, S. A., & Hulme, C. (2021). Early handwriting ability predicts the growth of children’s spelling, but not reading, skills. Scientific Studies of Reading, 25(4), 304-318. https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/10888438.2020.1778705

A qualidade inicial da caligrafia prediz o desenvolvimento da escrita

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AUTORES

João Lopes

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João Arménio Lamego Lopes dirige o projeto AaZ – Ler Melhor, Saber Mais. Licenciado em Psicologia pela Universidade do Porto (1981), Mestre em Psicologia da Educação e do Desenvolvimento (Universidade do Porto, 1991) e doutorado em Psicologia da Educação pela Universidade do Minho (1996). Professor da Escola de Psicologia da Universidade do Minho desde 1995.

Professor Associado com Agregação, da mesma Universidade (2004). Director do Departamento de Psicologia Aplicada (2015-2019) e do Mestrado em Temas de Psicologia da Educação da UM. Director do Programa de Doutoramento em Psicologia Aplicada para os países da CPLP. Presidente do Conselho Cientifico-Pedagógico da Formação Contínua de professores (2014-2018), representante de Portugal no CERI-OCDE (2015-2017) e membro do Conselho Geral do IAVE (2013-2018).

Soraia Araújo

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Soraia Araújo é doutoranda em Psicologia Aplicada, na Escola de Psicologia da Universidade do Minho. Licenciou-se em Psicologia, em 2018, na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, e concluiu o Mestrado em Psicologia Aplicada, em 2020, na Universidade do Minho.

Integra o Grupo de Investigação em Problemas de Aprendizagem e de Comportamento, do Centro de Investigação em Psicologia da Universidade do Minho, desde 2019, aquando da realização da sua dissertação de mestrado, intitulada “Formação Contínua de Professores: Necessidades, Participação e Barreiras”. No mesmo grupo de investigação, encontra-se a desenvolver a sua tese de doutoramento sobre as dificuldades de aprendizagem inicial da leitura. Integra, ainda, o Programa AaZ – Ler Melhor, Saber Mais, onde colabora, essencialmente, na escrita de textos de apoio sobre o ensino da leitura, dirigidos a professores do 1.º Ciclo do Ensino Básico.

Os seus interesses de investigação centram-se na área da Psicologia e da Educação. Especificamente, ensino da leitura e escrita, dificuldades de aprendizagem, perturbações do neurodesenvolvimento, métodos de ensino e formação de professores.

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