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Em Madrid, as escolas públicas cortaram duas semanas ao ano letivo sem alterar o programa. Examinámos os resultados que os alunos obtiveram nos testes antes e depois desta alteração e comparámo-los com os resultados das escolas privadas, que não implementaram esta mudança.

O peso que a duração do ano letivo tem nos resultados académicos é importante para várias entidades, incluindo os decisores políticos e a direção das escolas. O tempo de instrução é um fator fundamental na criação do capital humano e tem tido um papel decisivo em várias reformas educativas. A OCDE sublinha a importância do tempo de instrução para melhorar a qualidade e a quantidade dos resultados académicos.

O período letivo dos alunos do ensino primário e secundário varia muito de país para país. Os indicadores da OCDE de 2021 mostram que as crianças frequentam a escola, em média, 184 dias por ano. O período letivo dura 175 dias em Espanha, 162 em França e 190 no Reino Unido.

O caso do corte inesperado na duração do período letivo dos alunos do nono ano na região de Madrid (mais precisamente na comunidade autónoma de Madrid) em 2017/2018 é um exemplo interessante que merece uma análise mais profunda. Esta mudança antecipou os exames de recurso para uma data anterior, em Junho, reduzindo em cerca de duas semanas o tempo total de instrução para os alunos que tinham passado no exame à primeira. Os alunos aprovados não tiveram mais aulas, mas participaram em atividades culturais. Esta alteração pretendia também dar às famílias férias de verão mais prolongadas, uma vez que eliminava os exames de recurso em setembro.

Outras regiões espanholas seguiram esta medida, como o País Basco as regiões de Navarra, La Rioja ou Cantábria, que acabou por ser alargada a todo o país. Mas esta redução de duas semanas na duração do período letivo teve um efeito negativo no desempenho dos alunos, nomeadamente em Espanhol e Matemática. Os resultados do PISA 2018 também responsabilizaram esta mudança pelos maus resultados que os alunos destas regiões obtiveram de forma inesperada. O relatório referiu especificamente que «este impacto negativo é mais expressivo nos resultados das cinco províncias autónomas com exames de recurso antecipados». Os melhores alunos das escolas públicas foram o grupo que se ressentiu mais desta decisão, tendo assistido à diminuição do fosso que os separava dos colegas.

Há duas características importantes nesta alteração que contribuíram para este resultado. Em primeiro lugar, aplicou-se em escolas públicas e em escolas particulares financiadas pelo Estado (grupo de tratamento), mas não em escolas privadas (grupo de controlo), o que nos permite fazer uma análise contrafactual. Outra característica importante é o facto de, em Madrid, se terem realizado examos padronizados externos para medir o desempenho dos alunos do 10.º ano antes e depois desta alteração. Com base nestes pressupostos, seguimos uma abordagem de «diferença nas diferenças»: comparámos os resultados do grupo de tratamento com os resultados do grupo de controlo ao longo de tempo para percebermos o efeito diferencial desta mudança. A técnica de análise difference-in-differences, também conhecida por DID, é um método estatístico que se usa para estimar efeitos causais, comparando gradualmente as alterações nos resultados entre um grupo de tratamento e um grupo de controlo. Esta técnica permite isolar o impacto de uma intervenção específica tendo em conta as tendências que teriam ocorrido mesmo sem a dita intervenção. Seguimos o pressuposto de tendência paralela para afirmar que, sem tratamento, a diferença no desempenho entre alunos de escolas com e sem alteração seria constante.

A diferença entre o grupo de tratamento e o grupo de controlo é um período de duas semanas: no passado, ambos os grupos tinham o exame final na terceira semana de junho, mas o grupo de controlo (escolas privadas e particulares com financiamento público) fez o exame final na primeira semana de junho. Ambos os grupos realizaram depois o mesmo teste padronizado, administrado por uma entidade externa.

Eis uma representação visual do cronograma da experiência e do que ambos os grupos fizeram. A principal diferença é o período de duas semanas entre um e outro.

Figuras 1 e 2. Grupo de Tratamento e Grupo de Controlo

Esta análise é duplamente relevante. Em primeiro lugar, pretende avaliar uma possível solução para um problema constante no sistema educativo espanhol: o excesso de reprovações. Ao reprovar, os alunos têm de repetir um ano de escolaridade depois de ter reprovado no ano anterior. Este problema afeta mais de 30% de todos os alunos do ensino obrigatório em Espanha. Em segundo lugar, esta análise tem implicações mais alargadas que são de grande importância.

Apesar de algumas limitações e objeções — esta alteração no calendário surgiu de forma inesperada e estendeu-se a todas as escolas públicas no final do ano escolar; a variável de resposta foi uma avaliação de desempenho que ocorreu no mês de março seguinte; a nossa amostra tinha informação detalhada sobre as características socioeconómicas dos alunos — temos provas concretas de que uma pequena alteração no tempo de instrução (apenas duas semanas) pode ter um impacto substancial nas notas dos alunos: cerca de 0,13 vezes de um desvio padrão.

Este impacto foi especialmente significativo em Espanhol e Matemática, e os alunos com melhor desempenho parecem ter sido os mais afetados pela mudança. Comparativamente, o impacto desta redução no tempo de aprendizagem é semelhante ao efeito de aumentar o tamanho de uma turma em cerca de cinco alunos.

Em conclusão, e especialmente na sequência da pandemia covid-19, consideramos que é necessária mais investigação para compreender melhor as implicações a longo prazo e o papel do ensino em linha face ao ensino presencial.

 

Esta publicação tem por base um artigo científico escrito por Ismael Sanz e J.D. Tena, em 2021, e publicado na revista Kyklos, dois anos mais tarde, intitulado «Qual a importância de duas semanas de aulas? Utilização de uma experiência real para avaliar o efeito que uma alteração no calendário tem no desempenho dos alunos». O artigo está integralmente disponível aqui.

AUTORES

Ismael Sanz Labrador

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Ismael Sanz Labrador é doutorado em Economia Aplicada pela Universidade Complutense de Madrid. 

Além de professor do Departamento de Economia Aplicada da Universidade Rey Juan Carlos e Diretor Geral de Inovação, Bolsas de Estudo e Apoio à Educação da Comunidade Autónoma de Madrid, Ismael Sanz foi Diretor do Instituto Nacional de Avaliação Educativa do Ministério de Educação, Cultura e Desporto (2012-2015) e Presidente do Grupo de Desenvolvimento Estratégico do teste PISA, desenvolvido pela OCDE.

Juan de Dios Tena Horrillo

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Juan De Dios Tena é doutorado em Filosofia pela Universidade de Newcastle Upon Tyne, em Inglaterra. Foi professor na Universidad de Concepción (Chile), Università di Sassari (Itália) e Universidad Carlos III (Espanha). A sua investigação concentra-se em economia e estatística. 

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