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Actualmente, a educação é muito mais do que uma questão de currículo. Visa equipar os alunos com os conhecimentos e competências necessários para superarem os diversos desafios com que deparam, como a consciência social, a colaboração e a auto-regulação. O apoio socioemocional dos professores assume, por esta razão, um papel fundamental na modelagem de comportamentos pró-sociais, na aprendizagem social e, não menos importante, no bem-estar dos alunos.

De acordo com a literatura, a aprendizagem é optimizada quando os alunos estão inseridos em ambientes nos quais se sentem seguros. Os professores procuram, geralmente, envolver os alunos na sala de aula, motivá-los para a aprendizagem e ajudá-los a superar as dificuldades. Porquê? Mais especificamente, o que leva os professores a quererem desenvolver uma relação positiva com os alunos? Chang e Hall (2022) respondem a esta questão, mas, antes de avançar, é importante saber o que diz a literatura sobre o assunto.

Objectivos sociais dos professores: uma abordagem multidimensional

Uma instrução eficaz é influenciada não só pelo domínio dos professores relativamente aos conteúdos que leccionam e à gestão da sala de aula, mas também pelos objectivos sociais que os motivam a criar um ambiente de apoio à aprendizagem e a desenvolver relações positivas com os alunos. Os objectivos sociais dos professores são, aliás, uma das cinco orientações de instrução propostas por Butler (2012).

De acordo com Chang e Hall (2022), os objectivos sociais dos professores podem ser divididos em quatro orientações distintas:

  1. domínio social (no inglês, social mastery-approach goals) — Os objectivos de domínio social estão relacionados, segundo a literatura, com a intenção de os professores melhorarem as competências sociais e a relação com os alunos. Estes objectivos estão, portanto, intimamente relacionados com o desenvolvimento de competências interpessoais. Além disso, estão associados, por exemplo, a uma instrução de apoio à aprendizagem e ao domínio de conteúdos, a mais autonomia e assiduidade e a mais motivação para participar em actividades de desenvolvimento profissional;
  2. evitamento social (no inglês, social mastery-avoidance goals) — O evitamento social está relacionado com o receio de os professores perderem a conexão com os alunos ou não desenvolverem as competências sociais necessárias. De acordo com Chang e Hall (2022), embora o evitamento social esteja associado a resultados positivos na sala de aula, não é tão benéfico como os objectivos de domínio social, devido à natureza baseada no medo;
  3. competência social (no inglês, social ability-approach goals) — Os objectivos orientados para a competência social baseiam-se, muito simplesmente, na demonstração de competências sociais, para alcançar uma reputação positiva perante os alunos. De acordo com a literatura, estes objectivos estão associados a resultados positivos, como por exemplo, mais auto-eficácia no ensino de conteúdos, mas também a resultados negativos, como práticas de ensino orientadas exclusivamente para o desempenho, mais competição e resultados superficiais de aprendizagem;
  4. prevenção social (no inglês, social ability-avoidance goals) — Os objectivos de prevenção social estão relacionados com o evitamento dos professores relativamente a percepções negativas ou sentimentos de fracasso, caso não consigam estabelecer uma relação positiva com os alunos. Segundo alguns estudos, a prevenção social acarreta diversas consequências negativas quer na instrução (e. g., desempenho vs. instrução centrada na aprendizagem, menos apoio à autonomia), quer no bem-estar dos professores (e. g., cansaço e menos auto-eficácia).

Estudo de Chang e Hall: objectivos e participantes

Chang e Hall (2022) analisaram o impacto dos objectivos sociais dos professores nas crenças de auto-eficácia, na percepção da qualidade da relação com os alunos e na percepção de envolvimento dos alunos na sala de aula. Os investigadores testaram as seguintes hipóteses:

  • hipótese 1 — os objectivos sociais predizem a auto-eficácia dos professores, a relação professor-aluno e o envolvimento dos alunos na sala de aula;
  • hipótese 2 — o impacto dos objectivos sociais dos professores na relação professor-aluno e envolvimento na sala de aula é mediado pelas crenças de auto-eficácia dos professores.

Participaram no estudo 154 professores de escolas localizadas no Quebeque, Canadá. Os professores tinham, em média, 42 anos de idade e 15 anos de experiência profissional. A maioria dos professores era do sexo feminino (81,82%) e leccionava numa escola primária (52,60%) ou secundária (42,42%).

Os professores responderam a um questionário online, constituído por questões acerca das informações demográficas, objectivos sociais, percepção da qualidade da relação com os alunos, crenças de auto-eficácia e percepção do envolvimento dos alunos na sala de aula.

Principais resultados e ideias a reter

  1. A hipótese 1 foi confirmada. Os resultados mostraram que apenas os objectivos de domínio social (no inglês, social mastery-approach goals) predizem as crenças de auto-eficácia dos professores, a relação professor-aluno e o envolvimento destes na sala de aula. De acordo com Chang e Hall (2022), estes resultados indicam que os professores que procuram desenvolver uma relação positiva com os alunos tendem a sentir-se mais confiantes do que os professores cujos objectivos estão orientados para o evitamento e prevenção social (no inglês, social mastery-avoidance goals e social ability-avoidance goals, respectivamente).
  2. Os professores mais confiantes relativamente à capacidade de motivar os alunos para a aprendizagem, gerir o mau comportamento e aplicar, de forma adequada, estratégias pedagógicas têm uma relação professor-aluno de qualidade e níveis mais elevados de envolvimento na sala de aula. Segundo Chang e Hall (2022), estes resultados não são inesperados, uma vez que a percepção de competência dos professores influencia, significativamente, a relação com os alunos e, não menos importante, a sua aprendizagem e bem-estar. A hipótese 2 foi, portanto, confirmada.

Os resultados do presente estudo demonstram assim a importância de os professores procurarem melhorar as competências interpessoais, por exemplo, através da participação em programas de formação profissional, e adoptarem estratégias pedagógicas adequadas que lhes permitam desenvolver uma relação professor-aluno de qualidade.

AUTORES

João Lopes

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João Arménio Lamego Lopes dirige o projeto AaZ – Ler Melhor, Saber Mais. Licenciado em Psicologia pela Universidade do Porto (1981), Mestre em Psicologia da Educação e do Desenvolvimento (Universidade do Porto, 1991) e doutorado em Psicologia da Educação pela Universidade do Minho (1996). Professor da Escola de Psicologia da Universidade do Minho desde 1995.

Professor Associado com Agregação, da mesma Universidade (2004). Director do Departamento de Psicologia Aplicada (2015-2019) e do Mestrado em Temas de Psicologia da Educação da UM. Director do Programa de Doutoramento em Psicologia Aplicada para os países da CPLP. Presidente do Conselho Cientifico-Pedagógico da Formação Contínua de professores (2014-2018), representante de Portugal no CERI-OCDE (2015-2017) e membro do Conselho Geral do IAVE (2013-2018).

Soraia Araújo

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Soraia Araújo é doutoranda em Psicologia Aplicada, na Escola de Psicologia da Universidade do Minho. Licenciou-se em Psicologia, em 2018, na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, e concluiu o Mestrado em Psicologia Aplicada, em 2020, na Universidade do Minho.

Integra o Grupo de Investigação em Problemas de Aprendizagem e de Comportamento, do Centro de Investigação em Psicologia da Universidade do Minho, desde 2019, aquando da realização da sua dissertação de mestrado, intitulada “Formação Contínua de Professores: Necessidades, Participação e Barreiras”. No mesmo grupo de investigação, encontra-se a desenvolver a sua tese de doutoramento sobre as dificuldades de aprendizagem inicial da leitura. Integra, ainda, o Programa AaZ – Ler Melhor, Saber Mais, onde colabora, essencialmente, na escrita de textos de apoio sobre o ensino da leitura, dirigidos a professores do 1.º Ciclo do Ensino Básico.

Os seus interesses de investigação centram-se na área da Psicologia e da Educação. Especificamente, ensino da leitura e escrita, dificuldades de aprendizagem, perturbações do neurodesenvolvimento, métodos de ensino e formação de professores.

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