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Atividades simples para evitar perdas de aprendizagem durante o verão.

As férias de verão são, para muitos alunos, o momento mais esperado do ano. Será que as férias também trazem consigo o risco de se esquecerem do que aprenderam? Esta pergunta tem sido alvo de investigação desde os anos 90, altura em que surgiu o termo «perda estival de aprendizagens» (summer learning loss) para descrever essa perda provocada pela pausa letiva das férias grandes.

Um estudo de revisão de Harris Cooper (1996), uma das primeiras meta-análises a quantificar este fenómeno, estimou que as perdas poderiam equivaler a um mês de aprendizagem de um dado nível de escolaridade, ou mesmo mais. A interrupção revelou-se mais prejudicial na matemática do que na leitura, e com impacto significativo no cálculo e na ortografia.

Mais recentemente, revisões sistemáticas e meta-análises como as de Gierczyk e Hornby (2023) e de Baş (2023) confirmam essas conclusões. De facto, a interrupção letiva de verão pode traduzir-se em retrocessos significativos, sobretudo nos alunos dos primeiros anos de escolaridade ou provenientes de contextos socioeconómicos mais desfavorecidos. Uma das hipóteses levantadas é que, sem uma prática regular, áreas basilares da aprendizagem, tais como a descodificação, a escrita ou o cálculo — que exigem um treino continuado para se consolidarem — tendem a regredir. Embora muitas crianças as recuperem parcialmente nas primeiras semanas do novo ano letivo, nem todas o fazem ao mesmo ritmo.

A interrupção letiva de verão pode traduzir-se em retrocessos significativos, sobretudo nos alunos dos primeiros anos de escolaridade ou provenientes de contextos socioeconómicos mais desfavorecidos

A boa notícia é que pequenas ações, realizadas com leveza e prazer durante as férias, podem ajudar a evitar este efeito de perda. Neste artigo recente da organização norte-americana Children at Risk, destaca-se o papel dos pais na prevenção. Em atividades simples e integradas nas rotinas familiares, é possível apoiar as crianças sem necessidade de se replicar a escola em casa.

De seguida, encontram-se sugestões de atividades práticas, que podem ser adaptadas aos diferentes níveis de escolaridade.

Leitura: ler por prazer, todos os dias

  • Reserve diariamente 15 a 30 minutos para a leitura por prazer, adaptada ao nível e ao gosto da criança ou jovem. Deixe que o seu filho escolha os livros — bandas desenhadas, revistas ou pequenas histórias são igualmente válidas.
  • Mantenha ou reforce os seus próprios hábitos de leitura, pois este comportamento irá incentivar, pelo exemplo, o seu filho.
  • Visite bibliotecas e livrarias em família, ou promova trocas de livros entre amigos e familiares.
  • Leiam em voz alta e conversem sobre os textos: o treino de leitura em voz alta favorece a fluência leitora (essencial nos primeiros anos), e o diálogo reforça a compreensão e amplia o vocabulário.
  • Faça da leitura um jogo: defina um objetivo para o número de livros que a família pretende ler durante o verão e planeie uma celebração caso seja atingido (ou haja esforço consistente).

Escrita: escrever com propósito e imaginação

  • Incentive o seu filho a manter um diário de férias, com frases curtas (nos primeiros anos) ou parágrafos mais elaborados (no 2.º e 3.º ciclo).
  • Escrevam postais, cartas ou e-mails a amigos e familiares a relatar episódios das férias, promovendo a organização da escrita.
  • Criem listas em conjunto: desejos para o verão, ideias para passeios — promovendo a escrita funcional.
  • Façam registos para álbuns fotográficos ou contos inventados com base no que experienciaram. Os adolescentes podem optar por blogues ou guiões para peças ou vídeos caseiros.

Matemática: contar com a matemática no dia a dia

  • Inclua a matemática nas atividades diárias, como cozinhar. É uma excelente oportunidade de rever frações, multiplicações e proporções. Peça à criança que adapte a receita ao dobro ou à metade.
  • Nas compras, incentive a criança a explorar valores, comparar preços, calcular trocos ou aplicar descontos.
  • Promova jogos com números, tais como dominó, sudoku ou jogos de tabuleiro que envolvam estratégia e cálculo.
  • Explore livros que envolvam a matemática, tais como Figuras Figuronas, de Maria Alberta Menéres (1.º ciclo), ou Pequeno Livro da Desmatemática, de Manuel António Pina e Pedro Proença (indicado para o 5.º e 6.º ano).
  • Visite museus e centros interativos onde se observa a matemática no mundo real — das engenharias às ciências naturais.

Autonomia e autorregulação: rotinas e oportunidades

  • Crie uma rotina leve, mas estruturada, com momentos reservados para diferentes tipos de atividades. Garanta as horas de sono necessárias e alguma previsibilidade e consistência no ambiente, mesmo em férias.
  • Estabeleça com a criança pequenos objetivos semanais e incentive-a a acompanhar os seus progressos.
  • Dê-lhe oportunidade para tomar decisões, planear o dia ou realizar pequenas tarefas adequadas à idade.

Mais do que replicar a escola em casa, aproveite momentos do dia a dia para criar oportunidades de aprendizagem: em situações de brincadeira, em conversas ou nas tarefas familiares. As férias são uma etapa essencial do desenvolvimento, durante as quais podem coexistir o descanso e o estímulo cognitivo. Pequenos gestos consistentes podem fazer a diferença.

Referências bibliográficas

Baş, G. (2023). Effect of summer vacation on learning loss in mathematics: A meta-analysis of the findings. Yaşadıkça Eğitim, 37(2), 565-580.

Gierczyk, M., & Hornby, G. (2023). Summer learning loss: Review of research and implications for remediation of post-pandemic learning loss. Preventing School Failure: Alternative Education for Children and Youth, 67(3), 132-140.

Meyer, F., Meissel, K., & McNaughton, S. (2017). Patterns of literacy learning in German primary schools over the summer and the influence of home literacy practices. Journal of Research in Reading, 40(3), 233-253.

Selman, S. B., & Dilworth‐Bart, J. E. (2024). Routines and child development: A systematic review. Journal of Family Theory & Review, 16(2), 272-328.

Shinwell, J., & Defeyter, M. A. (2017). Investigation of summer learning loss in the UK—Implications for holiday club provision. Frontiers in public health, 5, 270.

AUTOR

Sofia Garcia da Silva

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Sofia Garcia da Silva é licenciada em Ensino Básico – 1º Ciclo (ESE - Politécnico de Lisboa), com especialização em Educação Especial – domínio cognitivo e motor (FMH - Universidade de Lisboa), e mestre em Neuropsicologia (ICS-Universidade Católica Portuguesa). Encontra-se atualmente a realizar o doutoramento em Formação de Professores e Supervisão, no Instituto da Educação da Universidade de Lisboa.

Exerce funções no âmbito da Educação Especial em contexto clínico, no CADIn – Centro de Neurodesenvolvimento e Inclusão, e em contexto escolar, no Park International School. Dedica-se ao acompanhamento de crianças com e sem perturbações do neurodesenvolvimento e à construção de materiais e programas de promoção de competências académicas nas áreas da leitura, escrita e matemática. Autora do Programa Brincar e Pensar para Aprender a Memorizar, publicado pela Hogrefe. 

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