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Introdução

A professora Marta está a ensinar aos alunos o significado da palavra «opção». Começou a aula com a seguinte definição: «uma opção é quando se tem uma escolha». Para ajudar os alunos a alcançar uma compreensão mais profunda da palavra, sugeriu-lhes que a relacionassem com experiências anteriores. Considere o seguinte exemplo:

Professora Marta: Pensem nos vossos pais. Que tipo de opções vos dão, por vezes, os vossos pais?
Alexandre: Comida.
Professora Marta: Uma opção alimentar? Que tipo de alimentos? Eles perguntam: «Queres comer legumes ou ...?»
Teresa: Arroz.
Professora Marta: E o que escolhes? Qual é a tua opção, Teresa?
Teresa: Arroz.
Professora Marta: Que opções te dão os teus pais, Fábio?
Fábio: Às vezes, a minha mãe compra comida.
Professora Marta: Por vezes, compra comida. Essa é a opção da tua mãe. Umas vezes ela cozinha, outras compra comida já feita.

Como vimos, a professora Marta ajuda os alunos a consolidar o conhecimento acerca da palavra «opção». A professora expande a compreensão conceptual da escolha individual dos alunos, incentivando-os a reflectir acerca das opções que os pais normalmente lhes oferecem.

A importância da aprendizagem de vocabulário é inegável. A aprendizagem de vocabulário constitui, aliás, uma das componentes básicas do ensino da leitura. Neste sentido, Neugebauer et al. (2021) incentivam a aplicação de uma estratégia que aumenta o conhecimento de vocabulário, denominada «estratégia de relações pessoais». Em que consiste, exactamente, esta estratégia? Consiste, muito simplesmente, em incentivar as crianças a relacionar as palavras leccionadas com experiências pessoais.

O que diz a literatura acerca da relação entre as palavras e as experiências individuais

A relação entre as palavras e as experiências individuais é sustentada por diversos estudos acerca da associação entre a aquisição de  vocabulário e a consciência das palavras, isto é, a meta-cognição, a motivação e o interesse pela aprendizagem de novas palavras. Além disso, esta relação é fundamentada por teorias cognitivas, que destacam a associação de novos conhecimentos ao conhecimento prévio,  uma vez que, muitas vezes, para retirar significado de uma história é necessário relacionar o conhecimento com as ideias do texto. Relacionar as palavras e as experiências individuais pode constituir, por isso, uma estratégia muito benéfica para a aprendizagem de vocabulário.

REFLICTA ACERCA DAS SEGUINTES QUESTÕES

  1. Que estratégias usa, actualmente, no ensino de vocabulário? De que forma pode aplicar a estratégia de relações pessoais?
  2. É-lhe possível incluir a partilha de experiências pessoais no ensino da leitura? Como poderia fazê-lo?
  3. Considere a diversidade de alunos da sua turma. Que palavras ou categorias de palavras poderia seleccionar para aplicar a estratégia de relações pessoais? É importante que as palavras seleccionadas sejam relevantes para os mesmos.

A importância do diálogo na aplicação da estratégia de relações pessoais

De acordo com Neugebauer et al. (2021), pedir aos alunos para relacionarem as suas experiências com determinada palavra não deve ser encarada como uma simples solicitação. Deve, sim, ser considerada um diálogo com os alunos acerca das experiências individuais. O diálogo desempenha, por isso, um papel fundamental na aplicação desta estratégia, uma vez que oferece aos professores a possibilidade  e fornecerem retorno aos alunos. Segundo a literatura, o retorno dos professores, quando desenvolve ou estimula as respostas ou comentários dos alunos acerca da(s) palavra(s)-alvo, está associado ao desenvolvimento de vocabulário. Por exemplo, num estudo  realizado em 2019, Hadley e Dickinson verificaram que quando os professores desenvolvem as afirmações das crianças, através de  definições ou informações adicionais, beneficiam mais a aprendizagem de vocabulário do que quando fornecem informações breves sobre as palavras-alvo ou analisam o significado das mesmas sem desenvolver as contribuições dos alunos.

Como aplicar a estratégia de relações pessoais na sala de aula?

Para apoiar os professores na aplicação da estratégia de relações pessoais na sala de aula, Neugebauer et al. (2021) apresentam diversas sugestões (tabelas 1 e 2 da versão PDF deste artigo). De forma geral, os investigadores enfatizam a importância do desenvolvimento de interacções significativas com os alunos, de forma a facilitar a sua participação e o fornecimento de retorno. Além disso, esta estratégia pode ser aplicada através de instruções explícitas, estimulando uma exposição variada às palavras-alvo (e.g., «Vamos imaginar que, hoje, fomos passear ao parque. O que vislumbrava e o que era obscuro?») e o uso frequente das mesmas (e.g., «Quando formos para casa, vamos procurar objectos que cintilam. Amanhã partilharemos as nossas escolhas. Combinado?»).

Considerações finais:

Estabelecer relações pessoais com as palavras constitui uma estratégia de ensino eficaz, principalmente quando a sua aplicação se baseia em práticas de ensino de vocabulário baseadas na evidência. De acordo com Neugebauer et al. (2021), na aplicação desta estratégia os professores devem procurar:

  • Avaliar o conhecimento dos alunos acerca da palavra-alvo;
  • Estimular o diálogo com os alunos;
  • Os alunos a fornecer respostas passíveis de retorno.

AUTORES

João Lopes

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João Arménio Lamego Lopes dirige o projeto AaZ – Ler Melhor, Saber Mais. Licenciado em Psicologia pela Universidade do Porto (1981), Mestre em Psicologia da Educação e do Desenvolvimento (Universidade do Porto, 1991) e doutorado em Psicologia da Educação pela Universidade do Minho (1996). Professor da Escola de Psicologia da Universidade do Minho desde 1995.

Professor Associado com Agregação, da mesma Universidade (2004). Director do Departamento de Psicologia Aplicada (2015-2019) e do Mestrado em Temas de Psicologia da Educação da UM. Director do Programa de Doutoramento em Psicologia Aplicada para os países da CPLP. Presidente do Conselho Cientifico-Pedagógico da Formação Contínua de professores (2014-2018), representante de Portugal no CERI-OCDE (2015-2017) e membro do Conselho Geral do IAVE (2013-2018).

Soraia Araújo

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Soraia Araújo é doutoranda em Psicologia Aplicada, na Escola de Psicologia da Universidade do Minho. Licenciou-se em Psicologia, em 2018, na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, e concluiu o Mestrado em Psicologia Aplicada, em 2020, na Universidade do Minho.

Integra o Grupo de Investigação em Problemas de Aprendizagem e de Comportamento, do Centro de Investigação em Psicologia da Universidade do Minho, desde 2019, aquando da realização da sua dissertação de mestrado, intitulada “Formação Contínua de Professores: Necessidades, Participação e Barreiras”. No mesmo grupo de investigação, encontra-se a desenvolver a sua tese de doutoramento sobre as dificuldades de aprendizagem inicial da leitura. Integra, ainda, o Programa AaZ – Ler Melhor, Saber Mais, onde colabora, essencialmente, na escrita de textos de apoio sobre o ensino da leitura, dirigidos a professores do 1.º Ciclo do Ensino Básico.

Os seus interesses de investigação centram-se na área da Psicologia e da Educação. Especificamente, ensino da leitura e escrita, dificuldades de aprendizagem, perturbações do neurodesenvolvimento, métodos de ensino e formação de professores.

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