Vários estudos provam que quanto mais se estuda, maior será o salário. Genericamente, por cada ano de escolaridade a mais, o salário aumenta, em média, cerca de 10%. Mas, os benefícios são também para a sociedade: maior educação gera menor criminalidade e melhores níveis de saúde.
Sabemos que quanto mais anos estudamos, melhor será o salário e menores serão as hipóteses de desemprego. Contudo, este facto nem sempre é totalmente apreendido pelos alunos e pelas suas famílias. Esta é uma questão há muito estudada pelos economistas da educação, sendo que as primeiras estimativas da relação entre educação e salários foram feitas por Mincer, em 1958, e alargadas em 1974, utilizando também a experiência de cada indivíduo no mercado de trabalho. Usando esta relação, Patrinos (2016) estima para todo o mundo que o retorno salarial de mais um ano de educação se cifre em torno dos 10%. Ou seja, um indivíduo com mais um ano de escolaridade tem, em média, um salário superior em cerca de 10%. Contudo, estes retornos são heterogéneos, nomeadamente em duas dimensões:
- No género, sendo maiores para as mulheres cerca de 11,5%, em comparação com 9,1% para os homens, diferencial este comum em todas as regiões do mundo;
- Em economias de países em desenvolvimento, as quais tendem a ter retornos do investimento em educação mais altos, facto que resulta de uma maior valorização das qualificações no mercado de trabalho, fruto de níveis de educação, em média, mais baixos.
Porém, estimar esta simples relação entre educação e salários acarta diversas dificuldades, sendo a principal a distinção entre aquilo que são as capacidades inatas do indivíduo e aquilo que lhe foi acrescentado pela educação formal. Por exemplo, o retorno salarial que um trabalhador obtém por se ter licenciado pode resultar não só da acumulação dos conhecimentos durante os anos adicionais de educação, mas também das suas capacidades cognitivas intrínsecas. Neste sentido, um famoso estudo (Ashenfelter & Krueger, 1994) comparou o percurso profissional de irmãos gémeos com capacidades inatas muito semelhantes e que cresceram no mesmo ambiente familiar, ficando a relação entre educação e salários a dever-se exclusivamente aos anos de escolaridade.
A partir desta abordagem, concluiu-se que mais um ano de educação gera retornos salariais entre os 12% e os 16%. Outras tentativas de medir os retornos do investimento em educação focam-se em indivíduos que foram afetados por alterações da escolaridade obrigatória, (Angrist & Krueger, 1991) apontando para maiores retornos no mercado de trabalho para os alunos que foram obrigados a permanecer mais tempo na escola.
Em Portugal ainda compensa ter curso superior
No caso específico português, considerando os dados dos trabalhadores do setor privado, o retorno de um ano adicional de educação cifrava-se em torno dos 7,6% para as mulheres e em 6,4% para os homens (Campos & Reis, 2017). Como se pode observar no gráfico em baixo, este prémio salarial aumentou até aos anos 1990, e desde então tem-se mantido relativamente constante. De salientar que, neste período, o retorno aumentou em cerca de um ponto percentual. A variação pode parecer baixa, contudo estamos a falar de um aumento por cada ano de escolaridade. Tal resulta de um contexto de alteração da composição da mão de obra, nomeadamente uma maior taxa de participação feminina, bem como uma progressiva maior escolaridade das mulheres em relação aos homens. Além disso, o número de trabalhadores com uma formação equivalente ao ensino secundário e ao ensino superior aumentou substancialmente.
Apesar de este aumento do número de trabalhadores qualificados poder levar a uma queda do seu prémio salarial, tal não se verificou, como podemos observar nos dois gráficos abaixo, o que sugere que a expansão das qualificações foi mais do que compensada por um aumento da procura da mão de obra qualificada. Desagregando as variações dos prémios salariais entre diversos níveis de qualificações, podemos notar que o prémio salarial associado a um indivíduo que escolheu seguir para o ensino superior face a um que se ficou pelo secundário era, em 1986, de cerca de 34% para homens e mulheres, tendo aumentado para 45% para as mulheres e 50% para os homens. Esta evolução foi positiva até meados da década de 1990, em particular para o caso das mulheres, tendo permanecido relativamente estável até 2009, período a partir do qual este prémio salarial veio a diminuir, até 2013 (último período analisado).
Na figura abaixo observa-se ainda que entre 2009 e 2013 o prémio salarial do ensino superior face ao ensino secundário foi mais baixo para os mais jovens do que para os mais velhos: por exemplo, em 2013, um trabalhador de 45 anos tinha um prémio salarial de 53%, enquanto para os trabalhadores com 35 anos era de 50%, e para os de 25 anos cifrava-se nos 34%.
Além dos retornos médios por nível de escolaridade, importa também distinguir os prémios salariais por áreas profissionais. Não existindo, neste âmbito, estudos recentes para Portugal, podemos ressaltar algumas das conclusões de estudos sobre os mercados de trabalho americano (Altonji et al., 2012), inglês (Benfield et al., 2018) e norueguês (Kirkeboen et al., 2016). Um padrão comum a todos estes casos foi o maior retorno dos cursos superiores na área das CTEM (Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática).
Ao apresentarmos esta medida dos retornos do investimento em educação, fizemo-lo na ótica da quantidade de educação adquirida, contudo, tal não implica nenhuma consideração acerca da qualidade do ensino ou dos conhecimentos adquiridos. Isto significa implicitamente que, por exemplo, nove anos de educação teriam o mesmo impacto, independentemente do sistema de ensino onde esses anos de educação fossem desenvolvidos.
Autores como Hanushek e Woessmann apresentam um exercício simples e que ilustra como as diferenças de riqueza entre países não dependem apenas da quantidade de educação, mas também da qualidade das aprendizagens. Estabelecendo a relação entre o crescimento macroeconómico de um conjunto de países e o número médio de anos de educação, conseguimos aferir que esta última variável explica cerca de 25% da primeira. Contudo, quando a esta simples relação acrescentamos os resultados por país nos testes do PISA, então os anos de educação explicam cerca de 73% do crescimento económico. Ou seja, a introdução de uma métrica de qualidade das aprendizagens permite-nos aumentar consideravelmente o poder explicativo da educação no crescimento económico. Se pensarmos não em crescimento económico agregado, mas em termos de salários individuais, e se à clássica equação de Mincer juntarmos os resultados no teste do IALS (International Adult Literacy Survey), observamos que os resultados têm um impacto significativo nos retornos salariais (Deny, et al., 2004). Ainda no âmbito da qualidade do ensino, para o mercado de trabalho inglês, observou-se que a qualidade da instituição superior tem, mais tarde, um peso expressivo nos retornos no mercado de trabalho (Britton et al., 2016).
O que ganha a sociedade com mais educação
Os retornos de educação apresentados anteriormente são os retornos pessoais de educação, contudo poderão existir também retornos sociais. Por exemplo, o facto de, na mesma empresa ou na mesma zona geográfica, convivermos com trabalhadores com níveis de educação mais elevados pode ter impacto sobre a nossa produtividade, levando a um aumento de salário, sendo este um clássico exemplo de retornos sociais de educação. Além disso, o aumento da educação também pode reduzir a participação criminal (Lochner & Moretti, 2004), e melhorar o comportamento quer em termos de saúde (Lleras Muney, 2005; Meghir et al., 2012), quer a nível das próprias decisões cívicas e políticas.
A possibilidade de o retorno social do investimento em educação poder diferir do retorno privado tem na prática uma importância clara.
Na verdade, a maior parte dos argumentos a favor da educação pública baseia-se no facto de a educação não só recompensar o indivíduo educado, mas também gerar benefícios que são compartilhados pela sociedade em geral. Deste modo, a magnitude do retorno social do investimento em educação é uma medida crucial para avaliar a eficiência do investimento público nesta área.
Em Portugal, como no resto do mundo, a educação continua a ser um investimento rentável a nível individual, e, portanto, os decisores políticos deverão ser capazes de incorporar este facto na formulação de políticas e sistemas de incentivos. Como os retornos privados são particularmente elevados no caso do ensino superior, é natural que os indivíduos continuem a investir em educação, em particular no nível universitário.
Num contexto de restrições orçamentais, os decisores políticos têm o desafio tanto de garantir a qualidade do sistema escolar público como de criar condições suficientes para que os indivíduos de rendimentos mais baixos tenham também acesso ao ensino superior. A dificuldade reside no facto de decorrer destas decisões uma eventual perda de qualidade na educação primária, básica e secundária, até porque o investimento nos níveis de escolaridade inferiores também contribui para o aumento do retorno dos níveis seguintes (Cunha et al., 2010). Estas tensões têm de ser eventualmente consideradas na definição e alocação das fontes de financiamento da despesa pública em educação. Trata-se de uma questão particularmente relevante na discussão do financiamento do ensino superior, nomeadamente na definição do valor das propinas, acesso a bolsas de estudo e empréstimos, uma vez que não é tão evidente que esse retorno privado seja acompanhado de um claro retorno social.
Referências
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Reis, H., e Campos, M. M., «Revisiting the returns to schooling in the Portuguese economy», Economic Bulletin and Financial Stability Report Articles and Banco de Portugal Economic Studies, Banco de Portugal, Economics and Research Department, 2017
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