Um estudo recente sugere que investir no conhecimento geral dos alunos pode levar a melhorias significativas e duradouras na compreensão escrita, o que vem lançar algumas dúvidas sobre os métodos de ensino tradicionais.
Um estudo rigoroso abrangendo mais de 2000 alunos concluiu que as crianças que seguiram um currículo com muitos conteúdos e promotor do conhecimento durante pelo menos quatro anos, com início no pré-escolar, tiveram um desempenho significativamente superior ao dos seus pares em testes de compreensão de leitura normalizados. Os alunos de famílias com baixos rendimentos melhoraram de tal forma que o seu desempenho nos testes estatais igualou o das crianças de famílias com rendimentos mais elevados.
Para compreendermos o alcance destas conclusões, é importante dispor de alguma informação de base. Durante os últimos 25 anos, pelo menos, os resultados em literacia de leitura têm permanecido inalterados nos EUA, com cerca de dois terços dos alunos com resultados inferiores a «bom» nos exames nacionais. Continuam a ser amplas as diferenças entre os alunos de contextos socioeconómicos desfavorecidos e mais ricos, e algumas estimativas apontam até para um aumento deste fosso, apesar dos vastos esforços feitos para o mitigar.
Para contrariar estes resultados baixos, as escolas redobraram esforços no ensino da leitura, que inclui a habilidade de decifrar palavras singulares. Nos últimos anos, intensificou-se a tentativa de alinhar esse aspecto do ensino da leitura com a evidência científica que mostra a necessidade de um ensino de acordo com o sistema fónico.
O ensino da compreensão da leitura centra-se nas capacidades
Ainda assim, a maior parte do tempo gasto na leitura é dedicado à compreensão, justamente o que os testes estatais e nacionais pretendem aferir. A abordagem mais comum centra-se nas capacidades e estratégias de compreensão, como «identificar a ideia principal» de um texto e «fazer inferências».
Depois os alunos praticam a leitura em livros — de ficção ou não ficção sobre temas diversos — escolhidos para corresponder ao seu nível de leitura. O objetivo não é as crianças adquirirem conhecimentos substanciais, mas dominarem competências que, em teoria, lhes permitirão compreender os textos complexos que irão ler no futuro.
Ao longo dos últimos anos, um número crescente de escolas começou a seguir programas de alfabetização elementar que constroem de modo sistemático o conhecimento e o vocabulário das crianças, facultando-lhes o tipo de instrução fónica confirmada pela ciência. No entanto, a tendência para a ganhar conhecimento não ganhou tanta força como o movimento para o sistema fónico.
Uma das razões pode ser a criação do conhecimento não ter provas experimentais de peso. Temos sim muitas provas que demonstram que os leitores com conhecimentos relevantes — quer do assunto sobre o qual estão a ler, quer de vocabulário académico geral — têm uma compreensão melhor. Estas provas reforçam a ideia de que os alunos de famílias com rendimentos mais elevados apresentam geralmente melhores resultados nos testes de leitura porque têm mais facilidade em adquirir conhecimento académico fora da escola. Ainda assim, tem sido mais difícil provar que ganhar conhecimento melhora a compreensão.
Isto acontece porque os testes geralmente usados para medir o sucesso de uma intervenção de reforço do conhecimento se baseiam na leitura de passagens sobre temas não abordados na intervenção. Os alunos podem precisar de muito tempo para atingir um nível de cultura geral que melhore a sua capacidade de compreender passagens sobre temas que não aprenderam, mas os estudos sobre os efeitos da aquisição de conhecimentos na compreensão da leitura duraram por norma um ano ou menos.
O estudo do Colorado
Isto leva-nos ao muito aguardado estudo plurianual que foi divulgado há pouco tempo e conduzido por investigadores da Universidade da Virgínia. A experiência tirou partido do facto de o Colorado ter há muito um número invulgar de escolas primárias que seguem um programa de aquisição construção do conhecimento. Os investigadores concentraram-se em nove dessas escolas na área de Denver com mais candidatos do que lugares, o que as obriga a sortear admissões no jardim de infância. Isto permitiu aos investigadores comparar um «grupo de tratamento» — crianças que entraram pelos sorteios — com um «grupo de controlo» constituído por crianças que se candidataram, mas não conseguiram vaga.
Mais de 500 crianças admitidas por sorteio receberam um programa baseado na sequência de conhecimentos essenciais. Em vez de dar primazia às faculdades de compreensão, esta sequência mergulha as crianças em bons conteúdos de história, geografia, ciências e outras disciplinas, em grande parte através da leitura de textos em voz alta pela professora e de debates nas aulas.
Os vários programas de aquisição do conhecimento desenvolvidos nos últimos anos cobrem diferentes tópicos de diferentes formas, partilhando todos o mesmo enfoque da sequência de conhecimento essencial no conteúdo. Em vez de saltarem rapidamente de um tema para outro, os alunos passam várias semanas a aprender sobre cada assunto. Também leem e escrevem sobre os conteúdos abordados no programa de base e não sobre temas aleatórios e desconexos. Estudos anteriores avaliaram os resultados de alguns destes programas, incluindo o Core Knowledge Language Arts (CKLA), ao fim de um ou dois anos e concluíram que tiveram um efeito positivo, mas modesto.
Os investigadores responsáveis pelo estudo do Colorado esperaram quatro anos, até as crianças atingirem o terceiro ano — o primeiro em que se fazem testes padronizados estatais — antes de medirem os resultados. Continuaram a analisar as notas dos testes desses alunos e dos seus pares que não ganharam o sorteio até ao sexto ano.
Concluíram que, na sua totalidade, o grupo conseguiu em cada ano vantagens significativas nos testes de leitura por comparação com o grupo de controlo. De facto, os ganhos foram suficientemente grandes para que, se transpostos para os estudantes americanos no seu conjunto, os EUA passassem a figurar entre os cinco primeiros países num teste internacional de leitura dado a alunos do quarto ano. Atualmente, os Estados Unidos ocupam o 15.º lugar entre os 58 países participantes.
Ganhos e avanços para alunos de famílias desfavorecidas
A análise dos resultados do estudo por nível de rendimento leva a outras conclusões. Oito das nove escolas situavam-se em zonas habitacionais de rendimentos médios ou elevados. Embora essas crianças supostamente adquirissem bastante conhecimento académico em casa, beneficiavam ainda assim da aquisição de conhecimento na escola. O tamanho do efeito — que mede a diferença entre o seu desempenho e o dos respetivos grupos de controlo — foi de 0,445.
No estudo do Colorado, o tamanho do efeito para os alunos de uma escola numa zona de rendimento baixo foi verdadeiramente extraordinário: 1,299. Também se verificaram grandes progressos nos resultados a matemática e no teste estatal de ciências feito pelos alunos do quinto ano. De facto, os ganhos foram tão expressivos nas três disciplinas, que, segundo os investigadores, eliminaram as diferenças nos resultados do Colorado entre alunos de famílias com altos e baixos rendimentos.
O estudo ainda não foi revisto por pares nem publicado, mas os dados foram avaliados de forma rigorosa. Ainda assim, há que fazer algumas ressalvas. A mais significativa é que os dados da escola numa zona de baixos rendimentos se basearam em apenas 16 alunos, e não conhecemos os níveis de rendimento das famílias a que esses alunos pertencem, pois os investigadores basearam-se no rendimento médio desse distrito.
Em todo o caso, um estudo nunca pode ser definitivo. Seria bom dispor de dados de mais estudos de longa duração como o do Colorado. Mas, tendo em conta todas as outras provas de que dispomos — tanto dos potenciais benefícios dos programas de aquisição de conhecimento como das falhas evidentes da abordagem atual —, não devemos esperar por mais estudos para tomarmos medidas. Já criámos entraves suficientes ao desenvolvimento das crianças — embora com a melhor das intenções — e não podemos dar-nos ao luxo de impedir que outros milhões de alunos alcancem todo o seu potencial.
Este artigo é inspirado numa publicação da autora publicada em Forbes.com.
AUTOR