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A prática de recuperação e o espaçamento do estudo são duas estratégias de aprendizagem muito eficazes. Uma revisão de vários artigos científicos mostra que os benefícios destes métodos não dependem do nível de ensino nem da disciplina. Combinar estas duas práticas pode até criar uma superestratégia com resultados garantidos.

Testar os conhecimentos enquanto se aprende e distribuir o estudo no tempo são duas estratégias apoiadas pela investigação psicológica que podem melhorar a aprendizagem em todas as idades e em várias áreas: é esta a conclusão de uma revisão de literatura publicada há pouco tempo pela revista Nature. Esta revisão de vários estudos, conduzida por Shana Carpenter (Universidade do Estado do Iowa), Steven Pan (Universidade de Singapura) e Andrew Butler (Universidade de Washington em St. Louis) reforça o valor da recuperação (como estudar) e do estudo espaçado (quando estudar) aplicada a todos os níveis de ensino e disciplinas, do pré-escolar ao ensino universitário, da leitura à matemática e às ciências.

O estudo espaçado

O estudo espaçado consiste em dar intervalos de tempo entre sessões de estudo. Para perceberem os efeitos do espaçamento na aprendizagem, os investigadores por norma comparam dois grupos de participantes: um que teve pelo menos duas oportunidades de estudo seguidas (praticando o estudo em bloco) com outro que teve oportunidades de estudo separadas no tempo (praticando o estudo espaçado).

Carpenter e colegas selecionaram 46 estudos que mostram vantagens significativas do espaçamento na aprendizagem, por comparação ao referido estudo em bloco. Estas publicações indicam os benefícios do espaçamento em várias idades, do pré-escolar à idade adulta (acima dos 50 anos), em todos os níveis de ensino e com diversos materiais de aprendizagem — incluindo nomes de brinquedos, regras de gramática, matemática, biologia, línguas estrangeiras, procedimentos cirúrgicos — ou até capacidades motoras. É de salientar que estes estudos seguem diferentes agendas de implementação do espaçamento, que variam entre os 15 minutos até 1 mês. Estes resultados mostram o poder desta estratégia de aprendizagem, que funciona em qualquer grau de ensino e para qualquer matéria.

A prática de recuperação

A prática de recuperação consiste em fazer testes repetidos, e é habitualmente comparada com estratégias mais passivas, como a releitura de materiais. No entanto, quando comparada com estratégias ditas mais ativas, como a elaboração de mapas de conceitos ou a escrita de notas na presença do material a apreender, a prática de recuperação também se revela mais eficaz.

Carpenter e colegas selecionaram 53 estudos que mostram vantagens significativas da prática de recuperação na aprendizagem. Tal como o que vimos em relação ao estudo espaçado, a prática de recuperação favorece a aprendizagem em todas as idades, desde o pré-escolar até à senioridade (dos 18 meses até bem depois dos 60 anos); em todos os níveis de ensino; com diversos tópicos de aprendizagem, incluindo a leitura, a matemática, as ciências, ou a medicina; e com diferentes modos de implementação dos testes: recordação livre, escolha múltipla, preenchimento de espaços, questionários de verdadeiro e falso, em modo virtual e até em jogos que incorporem a recuperação de informação. Estes resultados reforçam a ideia de que a recuperação é, provavelmente, a estratégia de aprendizagem mais poderosa para qualquer aluno em qualquer contexto.

Reaprendizagem sucessiva: a superestratégia

O que acontece quando se combinam duas estratégias de aprendizagem tão poderosas? Obtém-se uma estratégia ainda mais eficaz: a reaprendizagem sucessiva, descrita por Rawson e Dunlosky. A reaprendizagem sucessiva implica uma primeira sessão na qual os alunos recuperam a informação a aprender através de um teste que é avaliado. Esta sessão inicial é depois seguida por sessões de reaprendizagem, em ciclos sucessivos até se atingir um critério predeterminado, como um determinado total de respostas corretas. A aprendizagem é mais eficaz quando as sessões de reaprendizagem são separadas no tempo e quando a primeira sessão inclui práticas de recuperação adicionais, como responder três vezes acertadamente a cada questão.

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Como implementar as melhores estratégias

Apesar do potencial destes métodos, os alunos não costumam utilizá-los com frequência. A utilização de estratégias de aprendizagem eficazes depende da metacognição dos alunos, isto é, da sua capacidade para autoavaliar o seu conhecimento e usar essa informação para decidir como e quanto estudar. O principal obstáculo à adoção de estratégias tão eficazes como a reaprendizagem sucessiva ou as suas duas componentes, o estudo espaçado e a prática de recuperação, é o esforço que o seu planeamento e implementação requerem. Além disso, estas estratégias também poderão ser difíceis de manter porque podem parecer contraintuitivas, já que os resultados nos primeiros testes não são elevados e, por causa do espaçamento, o aluno pode mesmo sentir que está a desaprender inicialmente.

No seu artigo, Carpenter e colegas oferecem algumas táticas para que os alunos melhorem a sua metacognição ou, por outras palavras, aprendam a saber o que sabem e o que não sabem e a avaliar o quanto aprendem com diferentes métodos para que possam depois regular as suas decisões de modo a adotar os melhores:

  1. Explicar de um modo claro aos alunos a qualidade de diferentes estratégias de estudo.
  2. Desconstruir mitos e crenças erradas sobre a aprendizagem. Por exemplo, combater ilusões que ocorrem quando a estratégia utilizada parece simplificar a matéria a apreender, como quando se lê várias vezes a mesma coisa.
  3. Trabalhar com os alunos o planeamento do estudo, de modo a que percebam diferentes modos de usar a mesma estratégia e quais são mais favoráveis, tendo em conta fatores como a complexidade dos diferentes assuntos e a natureza do teste final.
  4. Ensinar a monitorizar o progresso, fazendo julgamentos metacognitivos regulares: Quão complexo é o material a aprender? O que está bem aprendido e o que precisa de ser trabalhado? Qual a qualidade das respostas dadas? Estes julgamentos informam como alocar o tempo de estudo a diferentes materiais e podem ser usados para aumentar a motivação e o interesse dos alunos.

Em suma, Carpenter e colegas destacam duas estratégias de aprendizagem tão poderosas, que funcionam com diversos materiais e em todos os níveis de ensino. No entanto, a sua utilidade depende da capacidade de os alunos avaliarem o progresso da sua aprendizagem e de criarem um plano e uma rotina de estudo que faça bom uso delas.

AUTOR

Ludmila D. Nunes é escritora científica para a Association for Psychological Science (APS). Doutorada em Psicologia pela Universidade de Lisboa, desenvolveu a sua investigação na área de Memória Humana e Aprendizagem na Washington University in St. Louis, na Universidade de Purdue, e na Universidade de Lisboa. 

Além da investigação, deu aulas de Introdução à Psicologia Cognitiva e de Memória Humana na Universidade de Purdue e foi revisora para várias publicações científicas.

Email: ludmilasdnunes@gmail.com

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