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Numa altura em que os professores estão à procura de formas de dar as suas aulas online, os vídeos podem ser seus aliados. Ainda mais quando já existem materiais deste tipo que podem facilmente ser usados. A investigação científica tem deixado algumas pistas sobre como se devem escolher ou construir vídeos que melhor ajudem os alunos a aprender.

Os vídeos nem sempre são os melhores materiais educativos, mas os alunos parecem gostar bastante deles, o que faz com que possam ser poderosos aliados dos professores que sofrem a pressão de dar aulas online. Um vídeo contém elementos de várias modalidades – imagens, animação, e som (habitualmente narração). Todos estes elementos têm de ser tidos em conta para escolher um vídeo educativo, tal como veremos adiante.

Vídeos educativos podem não ser óptimos, mas são um dos meios mais acessíveis para motivar os alunos

Mayer e colegas (2005) mostraram que se pode aprender mais com um diagrama estático acompanhado por texto do que com uma animação narrada. No entanto, os alunos tendem a acreditar que aprendem mais após verem vídeos, mostram mais interesse e preferem-nos aos textos (Nunes & Karpicke, 2014). Assim, vídeos educativos podem não ser óptimos, mas são um dos meios mais acessíveis para motivar os alunos quando as aulas são dadas remotamente. Além disso, existem já milhares de vídeos educativos disponíveis na Internet. E entre tantas escolhas, a questão que temos de responder é: «como identificar vídeos educativos que são úteis e estão bem construídos?». Iremos então delinear alguns princípios baseados em investigação científica que ajudam a responder a esta questão. Estes princípios, compilados por Mayer (2008), são válidos para selecionar vídeos online ou criar novos conteúdos que podem ser usados para substituir ou complementar as aulas. 

Os vídeos não devem ser redundantes.

Por exemplo, adicionar texto ao vídeo pode sobrecarregar o processamento da imagem do vídeo, dificultando a aprendizagem (Mayer et al., 2001). Várias experiências mostraram que alunos que assistiram a aulas computarizadas sobre ciência ambiental que incluíam apenas narração e animação demonstraram um conhecimento mais aprofundado dos tópicos estudados do que alunos que assistiram às mesmas aulas com narração, animação, e legendas (Mayer et al., 2001). Assim, um bom vídeo não deve apresentar demasiada informação visual (informação processada pelo sistema visual) ao mesmo tempo (Mayer, 2008). Os vídeos deverão ser visualmente simples, uma vez que demasiadas imagens a aparecerem no ecrã ao mesmo tempo podem dificultar o processamento da informação a ser aprendida.  

Os vídeos devem ser coerentes.

Adicionar informação desnecessária pode tornar um vídeo menos eficaz, mesmo que essa informação seja interessante. Por exemplo, Richard Mayer e seus colaboradores (por exemplo, Moreno & Mayer, 2000a) mostraram em várias experiências que, numa aula sobre como raios e relâmpagos se formam, tendo uma animação com narração de factos interessantes (como «Todos os anos, 150 pessoas morrem atingidas por raios»), adicionar-lhe animações irrelevantes mas interessantes (como clips de 8 segundos ilustrativos de raios e relâmpagos espectaculares) ou uma música de fundo, dificulta a aprendizagem (para um sumário, ver Mayer, 2008). Se não se conseguir evitar esta informação desnecessária – imagine que encontrou o vídeo quase-perfeito mas que este contém factos irrelevantes – a solução pode passar por adicionar sinais (setas ou sublinhados) à informação importante para que os alunos consigam diferenciar os factos que devem reter dos factos irrelevantes.

Os vídeos devem ter contiguidade temporal.

Narração e animação correspondentes devem ser apresentadas ao mesmo tempo. Numa série de experiências (por exemplo, Mayer & Anderson, 1991; 1992), Mayer e o seu laboratório mostraram que alunos expostos a aulas pelo computador sobre bombas de ar, travões, o sistema respiratório e a formação de trovoadas, aprendiam mais e conseguiam aplicar o conhecimento obtido mais eficazmente quando a apresentação da animação e da narração era simultânea, em vez de sucessiva. Por exemplo, num vídeo sobre o funcionamento do sistema respiratório, quando o narrador diz «o ar chega aos pulmões», a animação deve mostrar o ar a chegar aos pulmões e não aos alvéolos. Isto significa que a narração deve ser sincronizada com a animação, facilitando a ligação entre as imagens e as palavras. 

Obedecer a estes três princípios gerais ajuda a eliminar o processamento de informação irrelevante, que só obriga a esforço cognitivo e não ajuda a aprender. Mas existem ainda outros princípios que ajudam o aluno a navegar a informação complexa mas essencial que deve ser aprendida. 

  1. Segmentação dos vídeos. Sempre que possível, os vídeos devem ser apresentados de forma segmentada, ao ritmo do aluno. Por exemplo, um vídeo pode ser dividido em segmentos de 10 segundos e, após cada segmento, o aluno deverá pressionar uma tecla para continuar a apresentação. Mayer e colegas (por exemplo, Mayer & Chandler, 2001) mostraram que alunos que assistiram a aulas computorizadas sobre a formação de trovoadas eram melhores a aplicar os conhecimentos obtidos quando a aula era dividida em 16 segmentos, cada um com uma ou duas frases de narração com 8-10 segundos de animação, e tinham de pressionar uma tecla para passar ao segmento seguinte, do que quando a aula era apresentada como um todo. Este procedimento permite ao aluno adquirir toda a informação de um segmento antes de avançar para o seguinte (Mayer, 2008). Claro que a duração de cada segmento dependerá do tópico apresentado. No caso das experiências de Mayer, a explicação sobre como as trovoadas se formam consistiam em 16 passos, o que explica a divisão dos vídeos em 16 segmentos. Este procedimento de segmentação é especialmente importante quando os materiais são complexos e requerem o domínio de várias definições (no exemplo dado, a explicação sobre trovoadas implica dezenas de elementos, tais como partículas negativas e positivas, e temperaturas acima e abaixo do ponto de congelamento).
     
  2. Os vídeos não devem ser demasiado longos. Esta ideia está relacionada com a segmentação de vídeos. Um vídeo de cinco minutos pode ser mais eficaz do que um de 20. Os alunos têm dificuldade em manter-se focados durante longos períodos de tempo e quanto mais longo é um vídeo, mais provável é que os alunos sobrestimem a sua aprendizagem (Nunes & Karpicke, 2014). Numa série de estudos, Nunes e Karpicke mostraram que os alunos acreditaram que aprenderam mais após assistirem a um vídeo de 20 minutos sobre um tópico de Biologia do que após terem lido o texto correspondente ao vídeo. No entanto, o desempenho num teste de conhecimentos era semelhante após assistir ao vídeo ou ler o texto, indicando uma forte ilusão de aprendizagem causada pelo vídeo. Ao monitorizarem como os estudantes avaliavam a sua aprendizagem enquanto assistiam ao vídeo ou liam o texto, os investigadores mostraram que esta ilusão parece formar-se e aumentar após o minuto quatro do vídeo.
     
  3. A linguagem não deve ser formal. O uso de um estilo mais conversacional (por exemplo, «o ar chega aos teus pulmões» em vez de «o ar chega aos pulmões») pode aumentar o envolvimento do aluno com o narrador e a informação, levando a que este se esforce mais para perceber o que está a ser narrado (Mayer, 2008). Por exemplo, em 11 experiências, Mayer e colegas (por exemplo, Moreno & Mayer, 2000b) mostraram que alunos que assistiram a aulas em computador sobre o sistema respiratório, trovoadas, botânica, e engenharia industrial, aprenderam mais e aplicavam melhor o conhecimento obtido quando a narração tinha um estilo coloquial do que quando tinha um estilo formal.

Finalmente, além de tentar respeitar estes princípios quando se selecciona um vídeo educativo, preparar os alunos também poderá aumentar a eficácia do mesmo. Isto pode ser feito através da apresentação de uma lista dos termos chave que aparecerão no vídeo, acompanhados da sua definição, características, ou localização (Mayer, 2008). Em várias experiências (por exemplo, Mayer et al., 2002), alunos estudaram em computador temas como travões, bombas de ar, e geologia. Alguns dos alunos receberam informações que os prepararam para a tarefa – por exemplo, antes da aula sobre travões, viram os nomes dos seus componentes principais (como o pedal e o pistão do cilindro principal) associados à sua localização numa ilustração e à sua função individual (como o pistão a mover no cilindro central). Os alunos que receberam essa preparação tiveram melhor desempenho num teste no qual tinham de aplicar a informação aprendida do que os alunos que não a tinham recebido. A conclusão é que esta preparação familiariza os alunos com o que vão assistir e isso vai ajudá-los a organizar os conhecimentos enquanto assistem ao vídeo.

Referências

Mayer, R. E., «Applying the science of learning: Evidence-based principles for the design of multimedia instruction», American Psychologist, 63(8), 2008, pp. 760-769.

Mayer, R. E., & Anderson, R. B., «Animations need narrations: An experimental test of a dual-coding hypothesis», Journal of Educational Psychology, 83, 1991, pp. 484-490. 

Mayer, R. E., & Anderson, R. B., «The instructive animation: Helping students build connections between words and pictures in multimedia learning», Journal of Educational Psychology, 84, 1992, pp. 444-452. 

Mayer, R. E., & Chandler, P., «When learning is just a click away: Does simple user interaction foster deeper understanding of multimedia messages?», Journal of Educational Psychology, 93, 2001, pp. 390-397. 

Mayer, R. E., Heiser, H., & Lonn, S., «Cognitive constraints on multimedia learning: When presenting more material results in less understanding», Journal of Educational Psychology, 93, 2001, pp. 187-198. 

Mayer, R. E., Hegarty, M., Mayer, S., & Campbell, J., «When static media promote active learning: Annotated illustrations versus narrated animations in multimedia instruction», Journal of Experimental Psychology: Applied, 11(4), 2005, pp. 256-265.

Moreno, R., & Mayer, R. E., «A coherence effect in multimedia learning: The case for minimizing irrelevant sounds in the design of multimedia messages», Journal of Educational Psychology, 92, 2000a, pp. 117-125. 

Moreno, R., & Mayer, R. E., «Engaging students in active learning: The case for personalized multimedia messages», Journal of Educational Psychology, 92, 2000b, pp. 724-733. 

Nunes, L. D., & Karpicke, J. D., «Video learning and illusions of learning», palestra apresentada no Social and Cognitive Colloquium, University of Lisbon, Portugal, 2014, abril.

AUTOR

Ludmila D. Nunes é escritora científica para a Association for Psychological Science (APS). Doutorada em Psicologia pela Universidade de Lisboa, desenvolveu a sua investigação na área de Memória Humana e Aprendizagem na Washington University in St. Louis, na Universidade de Purdue, e na Universidade de Lisboa. 

Além da investigação, deu aulas de Introdução à Psicologia Cognitiva e de Memória Humana na Universidade de Purdue e foi revisora para várias publicações científicas.

Email: ludmilasdnunes@gmail.com

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